quinta-feira, 9 de junho de 2011

Reflexões pertinentes...

As crises não constituem anomalias do capitalismo, mas são uma das suas características mais fundamentais.

IHU On-Line - Se Marx previu a natureza da economia mundial no início do século XXI, com base na análise da “sociedade burguesa”, 150 anos antes, que espécie de previsões podemos fazer para nossa economia a partir da sociedade que temos hoje, baseada em valores consumistas e na autonomia?

Claus Magno Germer - Marx foi um cientista, não um profeta. Elaborou uma representação teórica do capitalismo. Se a teoria de um fenômeno o representa adequadamente, ela permite antecipar a ocorrência das principais características do desenvolvimento do fenômeno. A teoria de Marx sobre o capitalismo é uma teoria deste tipo, motivo pelo qual lhe permitiu não só explicar a natureza do capitalismo e do seu funcionamento, como ainda antecipar características que só se tornaram visíveis mais tarde. Além do seu pioneirismo na admissão e explicação teórica das crises, Marx explicou e antecipou o processo geral de centralização do capital que está na base da fase monopolista do capitalismo, inaugurada no final do século XIX; explicou a tendência, amplamente comprovada, de queda cíclica da taxa média de lucro; antecipou e fundamentou teoricamente a existência permanente do desemprego no capitalismo; antecipou o processo de proletarização crescente da população, que pode ser ilustrado pelo crescimento contínuo da proporção do proletariado industrial na população, que passou de apenas cerca de 5% da população mundial no início do século XX para mais de 30% no início do século XXI; antecipou o processo de aumento da polarização entre uma minoria de ricos e uma maioria de pobres, que é ilustrada cotidianamente nos meios de comunicação pelas estatísticas da pobreza e da miséria em escala continental, abarcando pelo menos dois terços da população mundial atual. Estes dados ilustram a antecipação mais importante que decorre da teoria de Marx: de que a intensificação progressiva, embora cíclica, da contradição entre a socialização crescente do trabalho e da produção, isto é, da riqueza, e a privatização crescente desta riqueza e sua concentração nas mãos de uma minoria cada vez mais diminuta, representa o crescimento das potências transformadoras inerentes ao capitalismo e conducentes ao seu fim. Esta contradição se resolverá, por imposição das circunstâncias, através da abolição da propriedade privada dos meios de produção e a instituição da propriedade social, e da conseqüente abolição do motivo egoísta do lucro como base da regulação do trabalho e da produção social e sua substituição pelo critério do atendimento das necessidades da coletividade, em uma palavra, através do socialismo.
Portanto, embora não se possa fazer previsões precisas, dada a complexidade do processo histórico, o que se pode dizer com base na teoria de Marx é que o capitalismo continuará apresentando uma seqüência de expansões e crises, ao longo das quais as contradições enumeradas acima se acentuarão, também de modo cíclico, ampliando a instabilidade global do sistema.

IHU On-Line - Qual a importância do Estado e da regulação dos mercados para recuperação da ordem financeira internacional?
Claus Magno Germer - O marxismo não é ingênuo em relação à natureza e funções do Estado. O Estado e o mercado são, juntamente com a economia, componentes do sistema integrado que é a sociedade capitalista. O Estado é um órgão do capital, isto é, de representação dos interesses da classe capitalista. Conseqüentemente, os instrumentos de regulação que utiliza destinam-se a preservar os interesses e o domínio desta classe e do processo de acumulação de capital. Nas crises, a ação do Estado consiste em socializar os custos, isto é, “sanear” a contabilidade de bancos e empresas mais atingidos, lançando o passivo sobre a sociedade, especialmente sobre os trabalhadores e pobres em geral. É o que está ocorrendo atualmente: os dois ou três trilhões de dólares das operações de salvamento articuladas até este momento pelos governos dos países capitalistas centrais destinam-se a salvar instituições financeiras, mas nada ou muito pouco se diz sobre o destino dos devedores não-capitalistas e dos trabalhadores lançados no desemprego, ou sobre a origem destes recursos.



Referência: Entrevista do economista Claus Germer à Revista on line do IHU, em 2008.
Leia a entrevista na íntegra em Revista IHU on line

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